Laís Viegas de Valenzuela

A viagem do Beto

dezembro 29, 2023 | by ipsislitteris.com

Hoje eu estou como uma manteiga derretida, por causa da viagem do meu filho querido (digo assim porque ele é o único filho, entre 3 filhas mais, todas também igualmente queridas). Não porque eu não quisesse que ele fosse, mas porque dói a partida, mesmo que seja temporária, por meses, como parece ser o caso dele. Mas a minha tristeza está se confundindo com a emoção de sentir um imenso orgulho pela “raça” que ele está demonstrando: ter a coragem de deixar um emprego que lhe proporcionava uma situação que todo mundo deseja e venera, como a um deus todo poderoso, e que compra tudo – o que nem é verdade.

Ter a coragem de abandonar a sua literal zona de conforto, o seu “ninho”pra partir para sua aventura mundo afora, para realizar seus sonhos, para conhecer outras terras e pessoas, além das fronteiras do lugar onde ele mora. Ter a responsabilidade e a organização para juntar seu dinheiro – mesmo que nisso contasse com a nossa ajuda e o nosso apoio incondicional – e empreender uma aventura dessa natureza, deixando o conforto material do seu “ninho” e o conforto emocional da família pra se lançar numa viagem dessa envergadura! Isso revela uma bravura que falta a muita gente, mesmo àqueles que nasceram em berço de ouro, ou, do lado oposto, aqueles que não têm nada, para quem a saída representa até a sobrevivência, o que não é o caso dele. A maioria age por necessidade, ou por expulsão, ou por rejeição, o que não é o seu caso.

E me enche de orgulho constatar que ele é um homem verdadeiro, destemido e audacioso, que não deixa que o medo ou a “preguiça” o limitem. Tenho certeza de que ele vai ser uma pessoa bem sucedida na vida, armado dessa coragem. Com uma dosezinha de vaidade, sinto que ele herdou um pouco de mim. Atrever-se é uma ação que a maioria das pessoas não empreende, sob quaisquer pretextos: reconheço, sem muita humildade, que eu já me larguei por diversas vezes: saí pra fazer faculdade em Fortaleza, um pequeno passo, é verdade, mas relativamente grande para a minha idade (18 anos) e temperamento, na época: tímida, mas não a ponto de paralisar-me de medo; depois, tive a audácia de sair de um casamento que não estava mais me preenchendo, arrastando nisso quatro crianças que dependiam de mim; saí de baixo “das asas” do meu bom emprego e de minha família, por um amor em que eu acreditava e que eu queria viver, trazendo também comigo três filhos que dependiam do meu destino e deixando atrás duas filhas, que não quiseram, por razões próprias, embarcar nesse trem.

E “j’ai réussi”, como dizem os franceses. Não só consegui e sobrevivi, fiz muito mais do que isso, como estou certa de que o meu filho vai fazer. O Alberto (meu marido) também já se atreveu a largar um emprego que lhe dava a certeza do pão seguro no fim do mês. Mas não se deixou persuadir. E também triunfou. Então, meu filho só tem exemplos a seguir, sabendo que essa façanha vai mudar sua vida para sempre: abrir novos horizontes, despertar novos interesses, conhecer outras pessoas, viver outras perspectivas. Poderá ter momentos de saudade, de tristeza, de falta e até mesmo de dificuldade, de desânimo… Mas não vai sucumbir a isso, porque sabe que é forte. Não tem medo de que o dinheiro se acabe, porque confia em si mesmo, além de que este não é o maior valor para ele. Se acabar, há várias fontes de trabalho de onde beber: por seus atributos, conta com amigos dispostos a ajudá-lo a conseguir, tem suas qualidades que lhe possibilitam sobreviver e viver. Tem a juventude a seu favor, tem um físico muito favorecido e uma inteligência privilegiada, uma personalidade muito interessante, uma boa educação doméstica, conhecimentos e talento suficientes para assegurá-lo, então, de que ter medo realmente? Se isso não fosse suficiente, ainda tem um pai e uma mãe sempre de braços abertos para ele…  

Também, a gente só tem motivo pra se orgulhar dele, que sempre demonstrou ter uma personalidade fascinante, também para as irmãs, também para os amigos, para os amigos da gente, para os tios e primos, enfim pra muita gente que interessa a ele… Minha tristeza não é por objeção, é simplesmente a de uma mãe que vê o filho partir por um tempo longo e com a probabilidade de ficar por lá: ou por trabalho, ou por amor, por casamento – a que eu também não faço objeção, mas até apoio – mas com a tristeza de tê-lo longe…

Eu tenho que me resignar, se o destino dele for por lá. O meu foi por aqui, imagino que a minha mãe, e principalmente o meu pai, também ficaram muito tristes, porque eu saía para sempre. Eu não estou inconsolável, não, pelo contrário, me consola saber que ele vai estar feliz, cumprindo o seu sonho, realizando as suas ilusões, descobrindo novos mundos e nova gente. Então, a felicidade vai me fazer feliz, embora triste e saudosa.

Eu nunca quis ter meus filhos para mim sozinha, para serem meus (isso eles sempre serão, mas não para a minha posse). Sei que eles são do mundo, e não há atadura que os prenda a nenhum lugar. E eu não gostaria de prendê-los a mim, mesmo que isso fosse possível.  Ao contrário, só tenho mesmo é que incentivá-los a perseguirem suas metas e seus sonhos, mesmo que seja longe de mim, de nós.  E com o nosso apoio, ainda que só moral, e os nossos bons augúrios, sei que ele vai vencer na vida, atirar-se a uma aventura que vai resultar positiva, com a bravura que ele possui.

Só desejo pra ele o melhor na vida, em todos os campos: profissional, amoroso, individual, como a pessoa destemida que ele é. Eu só gostaria que ele tivesse um pouco mais de contato comigo, que fico só nos bastidores aplaudindo o seu sucesso…

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